Por: Caroline Rodrigues
Será instaurada uma Câmara Setorial na Assembleia Legislativa de Mato Grosso para debater o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) voltado aos produtores rurais do Pantanal mato-grossense. A iniciativa tem o objetivo de aprimorar o texto do Projeto de Lei 442/2025, de autoria do deputado estadual João José de Matos – Dr. João (MDB) – que institui o PSA, e ainda discutir os indicadores e as formas de medi-los de maneira transparente e confiável.
Proposta pelo deputado Dr. João e aprovada pelos demais parlamentares da Casa, a câmara contará com a participação de entidades ligadas à atividade, como a Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato), além das secretarias de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico e Fazenda. O Sindicato Rural de Poconé foi convidado a participar como representante dos produtores pantaneiros.
O presidente do Sindicato Rural de Poconé, Ricardo Arruda, defende a proposta e vê o início da discussão como uma luz para os produtores que ainda resistem no Pantanal. “A sobrevivência econômica, a preservação ambiental e a cultura pantaneira se fundem à atividade pecuária. No entanto, precisamos de incentivos e de um olhar diferenciado, porque nós cuidamos do Pantanal, mas está cada vez mais difícil manter as áreas produtivas e preservadas”, afirma.
A expectativa da Famato e do Sindicato Rural de Poconé é que a primeira reunião da Câmara Temática ocorra em agosto, após o recesso da Assembleia. Na ocasião, terão início as discussões sobre o tema, com a participação efetiva dos pantaneiros, além da apresentação de propostas, notas técnicas e pesquisas científicas que possam contribuir para a formatação de um projeto com indicadores de sustentabilidade confiáveis, que servirão de base para criação de um fundo específico para o Pantanal. Nele, poderão ser aportados recursos de empresas interessadas em compensar impactos ambientais, de governos e também de entidades estrangeiras.
O analista em pecuária da Famato, Marcos Carvalho, explica que, atualmente, o bioma Pantanal depende mais dos pecuaristas do que os pecuaristas dele. Segundo ele, 95% do Pantanal mato-grossense está em propriedades privadas, e o bioma é um dos mais preservados do país, com 84% de vegetação nativa conservada.
De acordo com o especialista, essa preservação se deve à habilidade secular de manejo, que promove a limpeza dos campos, a manutenção dos pastos nativos e a prevenção de incêndios florestais. No entanto, trata-se de um tipo de trabalho que envolve altos custos, já que o próprio bioma impõe obstáculos logísticos e ambientais que encarecem a produção e colocam os pecuaristas pantaneiros em desvantagem competitiva no mercado.
“Hoje, é possível desenvolver a pecuária em várias regiões do Estado. Contudo, sem a pecuária, as áreas do Pantanal serão tomadas por espécies invasoras e, sem limpeza, haverá obstrução das passagens de água, aumento da matéria orgânica, crescimento dos incêndios florestais e perda da biodiversidade local”, avalia.
Diante desse cenário, a compensação econômica pelos investimentos dos pantaneiros na preservação ambiental é uma reivindicação legítima da classe produtiva. Muitos produtores já migraram para outras regiões, e as propriedades abandonadas tornaram-se um problema crescente no bioma.
Para o pesquisador da Embrapa, Walfrido Moraes Tomas, o Pantanal Mato-grossense é um exemplo de que produção e preservação podem caminhar juntas. No entanto, ele ressalta que as propriedades da região são maiores, mas a área produtiva é reduzida durante parte do ano devido às cheias e secas típicas do bioma.
Apesar das dificuldades, Tomas afirma que a atividade produtiva deve ser mantida, pois oferece serviços ecossistêmicos estratégicos e ainda produz uma carne de alta qualidade, em razão da pastagem natural e do sistema extensivo de criação.
Assim, segundo o pesquisador, a presença do pecuarista no Pantanal é essencial para a preservação do bioma. Porém, sua permanência precisa ser viável economicamente, considerando que, ao longo dos anos, os criadores foram empobrecendo em razão de restrições ambientais e políticas públicas insuficientes. Segundo ele, os desafios da pecuária na região começaram com a grande cheia de 1974, que trouxe grandes prejuízos aos produtores e reduziu as áreas disponíveis para o rebanho.
As cheias impactaram fortemente a região até meados dos anos 1990. Como consequência, houve abandono de fazendas e danos ambientais, já que a ausência da atividade pecuária levou à redução da limpeza das pastagens, ao aumento de espécies invasoras e à diminuição do manejo — como roçadas e queimadas controladas.
Além disso, os produtores passaram a sofrer com pressões internacionais por preservação ambiental. Essa cobrança chegou a um Pantanal já empobrecido economicamente e, por consequência, fragilizado politicamente.
Como fazer o pagamento – Uma das soluções para manter a biodiversidade no pantanal é o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Tomas afirma que a tendência mundial é remunerar quem preserva, e que a principal dificuldade está na definição de métricas e indicadores.
Mato Grosso já avança nessa direção por meio do projeto Fazendas Pantaneiras Sustentáveis (FPS), desenvolvido pela Famato em parceria com a Embrapa, com a participação de 15 propriedades na região do pantanal.
Hoje, por meio de um software, essas áreas são avaliadas com base em 57 indicadores científicos que atestam seus impactos ambientais, econômicos e sociais. Os resultados comprovam o grau de sustentabilidade de cada uma das propriedades e permitem a valoração delas, o que pode servir de base para o futuro pagamento pelos serviços ambientais prestados.
Além desta metodologia, o pesquisador disse que outras estão sendo desenvolvidas pela Embrapa com a mesma finalidade. Em todos os casos, o objetivo é ter números confiáveis e que possam ser extraídos de maneira mais rápida, eficaz e barata.