Ana Carolina Guerra da Redação
O prefeito de Cuiabá, Abilio Brunini (PL), expulsou a professora Maria Inês da Silva Barbosa, doutora em Saúde Pública e docente da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), da 15ª Conferência Municipal de Saúde, realizada nesta quarta-feira (30/08) no Hotel Fazenda. O motivo foi o uso de pronomes neutros no início da palestra da convidada, o que Abilio classificou como “doutrinação ideológica”.
A conferência, organizada pelo Conselho Municipal de Saúde — órgão independente da Prefeitura —, tinha como tema central “Consolidar o SUS: Com a Força do Povo, Participação Social e Políticas Públicas”. Maria Inês foi convidada como conferencista para debater os desafios da saúde pública com foco na inclusão e equidade no acesso ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Ao iniciar sua fala, a professora usou pronomes de linguagem neutra para se referir ao público, o que gerou imediata reação do prefeito. Abilio interrompeu a apresentação e declarou: “Durante a minha gestão não vou aceitar doutrinação ideológica”. Ele afirmou que o evento, por ser patrocinado pelo Executivo Municipal, deve seguir o que chamou de “regras institucionais” e exigiu que a fala fosse reformulada sem uso de linguagem neutra.
Maria Inês se recusou a seguir a orientação e deixou o espaço, alegando censura e autoritarismo. “Não vou me submeter a isso. Este é um espaço democrático, onde deveria existir espaço para o contraditório. A política de saúde é uma política de Estado, não apenas de um município”, declarou. Para a professora, a postura do prefeito é uma tentativa de se sobrepor ao Conselho Municipal de Saúde e restringir o debate sobre direitos e visibilidade de populações historicamente excluídas.
A conferencista também defendeu que o uso da linguagem neutra representa o reconhecimento de identidades diversas no atendimento à saúde pública. “Estamos falando de pessoas invisibilizadas, jovens que morrem por violência, corpos marginalizados. Não dá para discutir saúde pública ignorando essas existências”, disse.
O evento também contou com a presença do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), ex-ministro do Desenvolvimento Social e figura conhecida por seu posicionamento negacionista durante a pandemia de Covid-19.
Em nota oficial, a Prefeitura de Cuiabá justificou a intervenção como medida para garantir a “neutralidade ideológica” e “preservação da norma culta da língua portuguesa” em espaços públicos patrocinados pelo Executivo. “A política pública será debatida com base na legalidade, na clareza e na norma da língua portuguesa, que é o idioma oficial do nosso país”, afirmou Abilio.
A decisão do prefeito gerou forte repercussão entre participantes da conferência e pode provocar reação do Conselho Municipal de Saúde, que tem autonomia legal para organizar os debates sobre políticas públicas na área. Conselheiros presentes avaliam que houve interferência indevida do prefeito em um espaço deliberativo e participativo previsto na legislação do SUS.