O órgão sustenta que o governo descumpriu o prazo mínimo legal de 15 dias entre o edital e a votação, violando a transparência e o direito à participação popular. A ação foi movida pelo PT e agora aguarda decisão do Tribunal
Parecer do procurador de justiça José Antônio Borges Pereira reforça tese de que governo descumpriu prazo legal de 15 dias para convocar audiências, ferindo o direito à participação popular.
Um parecer do Ministério Público de Mato Grosso (MPMT) considerou ilegal o edital da Secretaria de Estado de Educação (Seduc/MT) que, em fevereiro deste ano, convocou consultas públicas para a conversão de dezenas de escolas estaduais ao modelo cívico-militar. A manifestação, assinada pelo procurador de justiça José Antônio Borges Pereira, conclui que a pasta, liderada pelo secretário Alan Porto, desrespeitou o prazo mínimo de antecedência previsto em lei, comprometendo a transparência e a participação da comunidade. O imbróglio agora aguarda uma decisão definitiva do Tribunal de Justiça.
O estopim da discórdia
A controvérsia começou quando a Seduc publicou no Diário Oficial de 17 de fevereiro de 2025 uma série de editais para a realização de consultas públicas. O objetivo era ouvir pais, responsáveis e alunos maiores de 16 anos sobre a implementação do programa de gestão cívico-militar. Contudo, a votação foi marcada para apenas oito dias depois, em 25 de fevereiro, atropelando a própria legislação que rege o tema. A Lei Estadual nº 12.388/2024, que instituiu o programa, é clara ao exigir que “a divulgação da consulta ocorrerá via publicação de edital no Diário Oficial do Estado, com no mínimo quinze dias de antecedência de sua realização, além de ampla divulgação na internet”.
Foi essa corrida contra o relógio que motivou o Diretório Regional do Partido dos Trabalhadores (PT/MT) a acionar a Justiça com um mandado de segurança coletivo. Na petição inicial, o partido argumentou que a pressa do governo “violou o direito líquido e certo da coletividade” e que a “ausência de ampla divulgação na internet e redes sociais oficiais da SEDUC” feriu de morte o princípio da publicidade. Para os autores da ação, a manobra impediu que a comunidade escolar tivesse tempo suficiente para debater um tema tão complexo, que muda radicalmente o dia a dia e o projeto pedagógico das instituições. A irregularidade, segundo o documento, “compromete a transparência e legalidade do procedimento, impedindo que a comunidade escolar tivesse tempo hábil para se organizar e participar da decisão”.
Justiça nega, mas processo avança
Apesar da urgência apontada, o pedido de suspensão liminar das consultas foi negado pela desembargadora relatora, Maria Erotides Kneip, em 7 de março. A magistrada entendeu que, como as votações já haviam ocorrido na data agendada, o pedido para suspendê-las perdeu o objeto. A decisão, no entanto, não entrou no mérito da legalidade do ato, deixando a porta aberta para a análise principal do caso, que é justamente o que está em curso.
Em sua defesa, o Estado de Mato Grosso argumentou que a via judicial escolhida pelo PT era inadequada e que houve, sim, ampla divulgação em portais de notícia e no próprio site da Seduc. A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) afirmou ainda que a mudança era um “anseio manifestado pela própria comunidade escolar” , especialmente em locais com alto Índice de Vulnerabilidade Social (IVS) , e que a questão se insere na competência do Poder Executivo, não cabendo intervenção judicial.
A palavra do fiscal da lei
O parecer do Ministério Público, peça-chave no processo, foi na contramão da defesa do governo. O procurador José Antônio Borges Pereira rechaçou os argumentos preliminares do Estado e concordou com o mérito da ação do PT. Para o MPMT, a legitimidade do partido para mover a ação é garantida pela Constituição, e a questão central é a flagrante desobediência à lei. A análise do procurador ressalta que a existência do prazo legal não é um mero detalhe burocrático, mas uma garantia de participação democrática.
Em um trecho contundente de sua manifestação, o procurador afirma que ficou demonstrada a ilegalidade do ato, já que o secretário de Educação “violou direito líquido e certo da coletividade ao tentar realizar a convocação da consulta pública […] sem cumprir o prazo mínimo de 15 (quinze) dias entre a publicação no Diário Oficial e a data do evento, conforme determina o artigo 8º, inciso II, alínea ‘d’ da Lei 12.388/2024”. Diante disso, o órgão ministerial opinou pela “concessão da segurança, para que seja declarada a nulidade da convocação e dos eventuais atos decorrentes da consulta pública realizada”.
Com o parecer do Ministério Público agora anexado aos autos, a decisão final sobre a validade do ato administrativo que pode alterar o futuro de mais de 30 escolas estaduais está nas mãos da Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo. O julgamento que se aproxima não definirá apenas o destino dessas escolas, mas também enviará uma mensagem sobre a importância do cumprimento dos ritos legais pela própria administração pública.